16.1.11

Quem espera...

Com o passar dos anos, das décadas e das gerações, alguns hábitos dão lugar a outros que vão ter mais importância ou não para as pessoas que vivem sob aquela realidade. Se o fato de a minha avó trabalhar fora na primeira metade do século XX, e ter um cargo relevante numa empresa importante, poderia assustar os mais conservadores da época, eu me assusto com mulheres que, 100 anos depois, preferem ficar esquentando a barriga no fogão a trabalhar fora e ter o mínimo de independência do marido. Pulando algumas etapas e chegando no meu objetivo inicial, sexo é uma coisa da vida que também já conseguiu superar alguns tabus. Mas ainda tem muita gente que enxerga isso como algo extraordinário, sagrado e que só pode ser feito na ocasião “correta”. Minha humilde opinião seguida de uma historinha:

Um cara conhece uma menina. Ele tem uns 20 e poucos e ela está chegando nos 20. Ela é virgem, ele não. Até aí nenhum problema. Ela acredita em príncipes encantados. É aí que começa a história.

Apesar de viverem vidas bem diferentes uma da outra, o casal estava se dando muito bem. Ela tinha acabado de entrar na faculdade e ele estava formando. Isso não importava, ele estava completamente vidrado em todos os gestos e reações da menina. O jeito que ela arrumava o cabelo quando caía no rosto, o jeito que ela sentava na mesa do bar, como ela procurava alguma coisa dentro da bolsa ou tirava uma blusa de frio. Algumas vezes ele arriscava. Depois de saírem do bar ou outro lugar à noite, ele perguntava se ela queria ir pra casa dele. Mas ela sempre respondia que preferia ir pra casa.

Ele esperou. Coisa de mulher, ainda não tá se sentindo segura. Esperou mais um pouco e perguntou de novo. A mesma resposta. Ele esperava também alguma surpresa! Quem sabe um dia ela não ligava perguntando se poderia ir pra casa dele, que estava precisando sair um pouco da casa dela? Ele esperava noite e dia por algum sinal. Mas chegou uma hora que esperar já não resolvia nada. Quanto mais ele esperava mais o tempo parecia se arrastar. Enquanto isso ele se lembrava de outros relacionamentos e via seus amigos correndo na sua frente. Sem dúvidas eles estavam muito mais felizes. Não suportava mais a ideia de hesitar, de estar preso àquela situação.

Ele já não sabia mais o que fazer. Continuar esperando, ou arrumar outra “diversão” enquanto a dele não se resolvia? Afinal eles não tinham nada muito sério ou certo. Um dia resolveu aparecer na porta do prédio em que ela morava de surpresa. Pelo horário ela estaria em casa. Parou o carro e olhou para a janela que um dia ela apontou como sendo o quarto dela. As luzes estavam acesas e parecia haver alguma movimentação. Pegou o celular e ligou pro número dela. Como ela morava no térreo, ele conseguiu ouvir a introdução de Viva la Vida, o toque do celular. A moça da caixa posta começou a conversar com ele e ele desligou. Dez minutos depois ele voltou a ligar. “I use to rule the...”. Ela desligou o aparelho. Ele olhou novamente a janela. As luzes continuavam acesas.

Na mesma noite, quando ele estava bebendo com os amigos em um buteco, ela retornou as ligações. “Eu te liguei às nove horas. Agora são quinze pras duas. Queria saber se você queria sair.” Ela deu uma desculpa qualquer e desligou o celular. Qualquer interesse que um dia ele teve por ela tinha terminado de acabar. Ele simplesmente não podia continuar esperando ou suportar tanta hesitação da parte dela. Não era pra ser, então não foi. Esse era o pensamento que ficava na cabeça dele agora. Apesar de tudo, ele esperava que ela encontrasse o príncipe encantado com quem tanto sonhava. Ele já tinha encontrado um caminho para seguir. Pensava se um dia ela acordaria para a realidade. E se esse dia não tardaria muito a chegar.

Baseado em: Hung Up, de Madonna. Composta por Madonna, Stuart Price, Benny Andersson, e Björn Ulvaeus. Faixa 1 do disco Confessions on a Dance Floor, de 2005.

1.1.11

Entre mãe e filho

Domingo de manhã.

_ Mãe, você não precisa ficar me falando essa ladainha toda de novo. Eu já sei disso tudo. Eu não vou me esquecer das minhas obrigações, eu não vou fugir delas. Só não vou mais morar com você.

_ Me desculpa se não fui a mãe que você sonhou. Se não sou tão incrível como as mães dos seus amigos. – O silêncio tomou conta do lugar durante alguns segundos e ela retomou a conversa – Se você tiver se esquecido de levar alguma coisa pode me ligar que eu levo pra você. Ou você pode vir buscar quando quiser. – Mais silêncio – Se um dia você precisar, ou quiser dormir aqui também pode vir.

_ Eu também não sou o filho perfeito, mas você é minha mãe. Não quero que você passe a noite em claro por minha causa. Espero que isso não aconteça. – Ele pensou duas vezes e preferiu dizer o que estava na sua cabeça – Sempre fui diferente dos meus irmãos. Nunca fui tão certinho quanto eles.

_ Você não quer vir lanchar comigo no sábado à tardinha? Eu arrumo uma mesa com bolo de cenoura com cobertura de chocolate, guaraná e aquela torta que você gosta. Coloco muito tomate! Seus primos estão aqui, posso falar com eles também!

Mais tarde ele se encontrou com uma amiga em um bar:

_ Sei que vou sentir falta da minha mãe. Pensar nela quando eu acordar e não der “Bom Dia” para ela. Mas eu não podia continuar convivendo todos os dias. E também já estava na hora de eu sair de casa!

A garota pegou um guardanapo da mesa onde estavam, tirou uma caneta da bolsa e rabiscou algumas palavras. Em seguida deu o papel para o amigo. Ele leu e releu. Eram poucas palavras, como se fossem parte de um poema, que resumiam a então relação dele com a mãe. Muito mais simples e sincero que qualquer coisa que filósofos ou poetas pudessem escrever. Ela conhecia a família há mais de uma década. Sabia bem o que se passava ali.

O sábado chegou. E ele estava indo pra casa da mãe quando pensou em levar alguma coisa pra ela. Passou na floricultura e comprou algumas mudas de flores que chamaram a atenção dele. Muito coloridas e com uma combinação diferente entre elas. Ficariam bem na jardineira da sala da frente. A vendedora contou que elas se chamavam Amor Perfeito. Seria um bom presente. Sua mãe gostava de mexer com a terra. Ele sentia um pouco de culpa pelas palavras que disse a ela há quase uma semana.

Quando chegou na rua que morava até a semana anterior ele viu a luz da sala de visitas acesa. Estacionou o carro, pegou a caixa com as flores para serem plantadas e procurou no bolso as chaves de casa. Ou daquela casa. Pensou e preferiu tocar a campainha.

_Você não precisa tocar a campainha meu filho. Essa casa é sua. Você pode voltar quando você quiser.

Ele estendeu a caixa com as flores e disse:

_ A moça da floricultura disse que se chamam...

_ Amor Perfeito – completou a mãe.

_Achei que ficariam bonitas naquela jardineira, na frente da casa.

_ Vão ficar lindas.


Baseado em: Amores Imperfeitos, da banda Skank. Composta por Samuel Rosa/ Chico Amaral. Faixa 4 do disco Cosmotron, de 2003.


Nota da autora: Desculpem o sumiço. Me dei o mês de dezembro de férias do blog!